Diário de Bordo - Sérgio

 

25/11/2006

Dia de sair para o Caribe! Logo tomamos nosso café da manhã e arrumamos todo o barco, guardando tudo para não cair. O Cláudio chegou e trouxe o livro Kon-Tiki para o Jonas. Após enchermos o tanque de água e dar uma lavada no bote e no barco, começamos a soltar os cabos. O Cláudio nos ajudou e logo estávamos prontos para sair. Quando o Rodrigo tentou engatar o motor, um barulho forte começou a vir dele. Tentamos sair, mas após uns 30 metros navegados, vimos que não daria para usar o motor daquele jeito, por causa da vibração. Como o eixo gira livre sempre que velejamos, a vibração também seria sentida e poderia estragar algo. A melhor opção era voltarmos. Despedimo-nos do Beduína, que seguiu viagem e, com um sentimento de frustração atracamos novamente na marina, com a ajuda do Cláudio e de um bote de apoio, por causa do forte vento lateral. A impressão é que o eixo estava desalinhado ou havia empenado, o que causava uma forte vibração e barulho no motor quando era engatado. Sendo sábado à tarde e sem mais o que fazer, tomamos uma cerveja e comemos esfihas. O Rodrigo conseguiu falar pelo SSB com o Torres, do Kanaloa, que estava em Lençóis e disse que as condições de ancoragem não eram boas e ele estaria saindo logo de lá. Talvez tenha sido melhor mesmo não ir. Ele não viu o Kaká-Maumau e o Too Much por lá. Tirei uma soneca no final da tarde e, então, fomos finalmente conhecer um pouco de Fortaleza. Pegamos a perua do hotel e seguimos para o Dragão do Mar, um centro cultural com restaurantes, um espaço muito legal de Fortaleza e que fica ao lado da marina. Comemos pizzas lá, passeamos um pouco e retornamos à marina. Ainda ficamos com a Márcia escutando músicas de um evento que acontecia na marina e conversando sobre nossa “vida de velejadores”.

 

26/11/2006

Como é domingo e temos de esperar pela segunda-feira para tentar arrumar o barco, tiramos o dia de folga. Após o café da manhã e arrumações, fomos para a piscina, onde conversei com o “Boy”, um senhor amigo do Ladislau e da Thereza, que conhecemos no hotel Ele dá apoio a muitos velejadores famosos nas competições. Aproveitei e coloquei em dia meus diários, enquanto as crianças brincavam na piscina e no salão de jogos. Vimos a largada da última prova do Campeonato Brasileiro de Windsurf e almoçamos uma torta na piscina. Na parte da tarde, uma pessoa que trabalha com manutenção de barcos apareceu e a única coisa que fez foi mergulhar pra examinar o “pé-de-galinha” do barco, coisa que eu e o Rodrigo já havíamos feito ontem. Após ligar para um mecânico de confiança em Parati, o Rodrigo chegou à conclusão que o problema é que o eixo está empenado mesmo. Tomamos nosso banho e, finalmente, fomos aproveitar um pouco de Fortaleza. Pegamos a perua do hotel e seguimos para o Dragão do Mar, com a idéia de ir ao planetário ou ao cinema. Chegando lá, bateu a fome em todos e resolvemos pegar um táxi parar ir ao “Colher de Pau”, um restaurante de comida típica da região que meu irmão indicou. Comemos carne-de-sol, paçoca e o famoso baião-de-dois, mistura de arroz, feijão verde e temperos. A comida estava ótima e o Jonas, nosso especialista em feijão, aprovou com méritos o baião-de-dois. Retornamos ao Dragão do Mar, onde tomamos sorvetes, as crianças viram um pedaço de uma peça infantil na praça e eu aproveitei para bater algumas fotos do lugar. Retornamos ao hotel, onde ainda conversei um pouco com a Márcia, enquanto as crianças brincavam.

 

27/11/2006

O Rodrigo acordou cedo e foi até o estaleiro INACE, que fica ao lado do hotel, mas não achou ninguém para conversar sobre subir o barco para remover o eixo. Tomamos café, as crianças foram para o Marina’s Kid e o Rodrigo foi atrás do mecânico. Na verdade, o Bitonho não é um mecânico, mas sim um “faz tudo” em barcos e conhece todo o pessoal do estaleiro INACE. Com o Bitonho, fomos até o estaleiro para tratar da puxada. Conversamos com o Robert, responsável do estaleiro, amigo do Bernardo, comodoro do Iate Clube da Paraíba, e velejador de Hobbie Cat 16. Infelizmente, o guindaste que poderia ser usado para puxar o Cavalo Marinho iria sair para fazer um serviço fora. Para nossa sorte, enquanto conversávamos com o Robert, o João do Guincho, responsável pelo guincho, apareceu, dizendo achar melhor ir no dia seguinte, para o guincho não dormir fora. Que sorte! Marcamos, então, a subida do barco no começo da tarde. Retornamos contentes, passando pelas dezenas de barcos de pesca e navios parados no estaleiro. Comemos alguma coisa, arrumamos o barco e seguimos para o estaleiro com o Bitonho para nos auxiliar. Quando chegamos lá, tivemos de esperar um pouco, pois ainda estavam montando o guincho. Dali, parados entre uma grande balsa de mais de cem metros de comprimento e vários pesqueiro de aço, vimos que a operação ia ser difícil. Algum tempo depois, chegou o guincho e logo o responsável pela subida, o Popô, já estava com uma mascara de mergulho dentro da água para coordenar a operação. O grande guincho, para até sessenta toneladas, foi até a ponta do píer, os pesqueiros foram afastados, o Cavalo Marinho foi posicionado ao lado do píer e logo grandes cintas eram descidas para serem passadas por baixo do barco. Foi preciso remover o estai de popa do mastro principal e recolher a antena de SSB, o amantilho da retranca e os lazy-jack’s da mestra, para a grande roldana com dois ganchos do guincho poder entrar para passar as cintas. Qualquer erro poderia provocar um grande estrago, em virtude dos grandes pesos e esforços que eram exercidos. Depois de um bom tempo de preparação, com as cintas já passadas, descemos rapidamente do barco, indo para o bote observar a subida. O Cavalo Marinho começou a subir e os funcionários do INACE controlavam o barco com cabos. O Rodrigo estava com o “coração na mão” e, depois de dois leves toques, um no casco e um no leme, mas sem estragar nada, o Cavalo Marinho estava em cima do píer! Após a manobra, com sobras de emoção para quem estava vendo da água, encostamos o bote num pesqueiro, galgamos seu costado, pulamos para o píer e logo eu estava escalando o guincho para poder chegar ao barco. Comecei a desmontar o eixo, coisa que não foi fácil. Ele estava emperrado, pois entrou sob pressão na cruzeta. Após duas horas de trabalho duro na casa de máquinas apertada, conseguimos soltá-lo! Ao removê-lo totalmente, deu para notar que estava muito empenado e soubemos que só poderia ser arrumado amanhã. Foi um balde de água fria, só de imaginar uma nova subida do barco. Nos arrumaram um pedaço de eixo para ser encaixado no buraco para não entrar água, fechamos o selo mecânico nele e o barco foi recolocado na água. O hélice também precisava de reparos e também ficou com os funcionários do INACE. Sem eixo e, conseqüentemente, sem motor, rebocamos o barco com dois botes para uma ancoragem entre o estaleiro e a marina. Soltamos a âncora e fomos buscar o pessoal em terra. Após contar todas as novidades e jantarmos, fomos dormir o merecido sono, depois de um dia cheio de emoções e muito atribulado.

 

28/11/2006

Acordamos bem cedo, pois a âncora do Cavalo Marinho havia garrado um pouco e estávamos indo para cima do nosso vizinho de ancoragem, o TAO. Eles soltaram um pouco mais de corrente, mas mesmo assim, continuávamos a nos aproximar. Soltamos a segunda âncora e então ficamos bem firmes. Tomamos o café da manhã e, cedo, eu e o Rodrigo fomos para ver como estavam o eixo e o hélice. Surpresa!!! Os dois já estavam prontos e ainda ia ser fabricada uma porca para substituir a porca do hélice, que estava fora de medida e por pouco o hélice não foi perdido! Voltamos contentes para o barco. Enquanto todos desciam para terra, eu fiquei de olho no barco, aproveitando para dar uma ordem e arrumar algumas coisinhas. A Márcia levou o Rafinha no médico, pois ele estava reclamando de dores no ouvido e o Rodrigo foi comprar algumas ferramentas que precisávamos. No final da tarde, peguei o Jonas e fomos visitar o fantástico estaleiro, acho que o maior estaleiro particular do Brasil e vimos alguns dos maravilhosos barcos que estavam fabricando. O lugar é lindo para fotografar e a visita, mesmo rápida, valeu muito, particularmente para o Jonas. Tivemos a boa notícia que o guincho está voltando e acabou o outro trabalho. Amanhã poderemos tirar o barco e acabar o serviço! Voltamos ao barco, pegamos as crianças e fomos tomar banho. A Márcia voltou com o Rafinha, que está com infecção de ouvido e garganta e terá que tomar antibióticos. Fomos dormir cedo, pois o dia amanhã será trabalhoso.

 

29/11/2006

Acordamos eram oito horas e, após um rápido café da manhã, desembarcamos a Márcia e as crianças e levamos novamente o barco para a ponta do píer. O Bitonho trouxe dois botes de apoio e cinco rapazes para ajudar a levantar as âncoras. Mesmo assim, não foi fácil! Como tudo que se faz pela segunda vez fica mais fácil, às dez horas da manhã já estávamos subindo o barco, com tudo em ordem. Desta vez a tensão foi menor e pude até fotografar a subida. Logo, eu e o Rodrigo escalamos o barco e removemos o pedaço de tubo emprestado. O eixo desempenado foi colocado e, sem grandes dificuldades, logo estava no lugar. Ao meio-dia descíamos o barco arrumado e, sem muita ajuda, o Rodrigo ligou o motor, giramos o Cavalo Marinho e o levamos até a marina. O motor não vibrava nada! Estava melhor do que antes. Nós dois sozinhos manobramos o barco e encostamos no píer. Como não havia ninguém lá, tive de laçar o cabeço para amarrar o barco. Quando o Rodrigo ia descer para amarrar direito os cabos, aconteceu o único acidente de toda a arrumação: lá foi o Rodrigo para dentro da água, quando tentou subir do bote para o píer! Ficamos arrumando tudo: recolocamos estais, guardamos coisas soltas e resolvemos seguir para o Caribe apenas no dia seguinte. Após três horas de arrumação, fomos comer um lanche no hotel e demos as boas novas para a Márcia e as crianças. Voltei ao barco onde arrumei tudo que eu podia e o final do dia foi reservado ao bate-papo e ócio na beira da piscina, conversando com o casal do TAO. O Cláudio apareceu para se despedir e demos um grande abraço no novo amigo, prometendo não perder comunicação. Eu estava moído de cansaço e, após um bom banho, fui para a deliciosa cama do Cavalo Marinho.

 

30/11/2006

Acordamos tarde e fomos todos tomar o café da manhã em alto estilo no hotel. Comemos bastante no excelente buffet, arrumamos as últimas coisas no barco, nos despedimos do Armando, responsável pela marina e soltamos as amarras quando era meio-dia. Passamos ao lado dos windsurf’s do Campeonato Mundial, que estavam para largar e tomamos a direção de mar aberto, deixando Fortaleza, que ainda teremos de voltar para conhecê-la de verdade, para trás. A navegação foi feita para chegarmos logo em grandes profundidades, o que diminui o tamanho das ondas e nos coloca fora dos pesqueiros do local. Após um tempo navegando, golfinhos brincalhões vieram até o barco e ficaram na proa fazendo seu sempre belo balé. Consegui fotografar e filmar, mas a Carol, que dormia, não acordou para vê-los. Todos foram se acostumando novamente com o mar e eu fui ajudando em tudo que eu podia. Após anoitecer, comemos algumas coisas gostosas que a Márcia havia feito antecipadamente e começamos nossos turnos da noite, sem ver muitos barcos, em função da rota que fazíamos. A nota engraçada da noite foi do Rodrigo: ele dormia tranqüilamente no cockpit, quando despertou com um “bicho” em cima dele. Deu um grito e um pulo, pulou para o outro acento do barco e o “bicho” caiu em cima do Nick, que dormia no chão. Era um peixe voador, que se debatia freneticamente!!! O Nick não acordou e o peixe foi jogado de volta à água. Nós começamos bem nossa viagem de mais de mil e seiscentas milhas até Tobago no Caribe, com ventos de 17 a 23 nós aparentes pelo través e correnteza de 1,5 a 2 nós ajudando! Estamos na “auto-estrada” dos ventos e correntes, que há centenas de anos leva os navegadores ao Caribe, andando a oito nós de velocidade média.

 

01/12/2006

Meu turno da noite transcorreu tranqüilamente e a única novidade é que o lazy-jack quebrou novamente! Não sei porque as velerias insistem em usar esse sistema, sendo que o lazy-mate dá muito menos problemas! Fui para a cama às cinco horas da manhã e acordei novamente eram quase dez. Ao sair para o cockpit, estava armada uma festa! Vários balões coloridos com “carinhas” feitas em papel pelas crianças e vários cartazes de “Feliz Aniversário”, para comemorar o meu quadragésimo quinto aniversário. Ganhei o livro “Pai Rico, Pai Pobre” de presente da tripulação do Cavalo marinho. Também ganhei um bom vento de Eolo e um bom mar de Netuno, que fez a moral da tripulação crescer muito. Com um sol bonito brilhando, fomos todos para a proa e lá, com um balde e shampoo, nós todos tomamos um delicioso banho de mar! Normalmente isso tira o “bode” do começo de viagem e dá uma disposição extra para todos. A Carol e a Márcia, que sofreram um pouco de enjôo no primeiro dia de viagem, melhoraram totalmente. Fora a saudade das pessoas queridas, passar esse aniversário no mar foi muito bom! Para o almoço, comemos lazanhas e, no começo da noite, apenas beliscamos pães, patês, tomates secos, berinjela refogada e queijos. Durante a noite, no meu turno, fiz os diários atrasados. Um pássaro pequeno veio voando atrás do barco e pousou sobre o painel solar. Cheguei a dois metros dele e pensei em bater uma foto, mas não quis assustá-lo e desisti da idéia. Soube ainda que, durante a noite, uma luva pendurada no “dog-house” caiu sobre o Rodrigo, que dormia no cockpit. Assustado, ele deu um pulo e um grito, achando que era outro peixe voador.

 

02/12/2006

Ao acordar, soube que estávamos perto da linha do Equador. Ficamos esperando ansiosos e a cruzamos eram 5:40 hs da manhã. Eu, o Jonas, a Carol e a Márcia estávamos acordados e comemoramos o acontecimento. A Márcia ficou tentando bater fotos do GPS e, exatamente na hora da passagem, as pilhas acabaram! O Nick e o Rafa acordaram e ficaram conosco brincando no cockpit, enquanto a Márcia ia para seu descanso merecido. O vento caiu para 12 a 15 nós aparentes, entrando mais por alheta, e nossa velocidade caiu para seis nós de média. Passamos um dia agradável e, no meio da tarde, as crianças cobraram outro banho de balde. Lá fomos nós todos para a proa do Cavalo Marinho, com shampoo e toalhas. Após o banho, fizemos capeletis com molho de tomate. Estavam deliciosos! Após o almoço, deitei na sala e comecei a ler “Pai Rico, Pai Pobre”, meu presente de aniversário. No começo da noite, o vento caiu mais um pouco. A noite transcorreu muito tranqüila, sem nenhum navio à vista.

 

03/12/2006

Meu turno da noite transcorreu muito tranqüilo e, conseqüentemente, deu muito sono. Estávamos indo na direção noroeste, quase em cima da direção onde a lua estava se pondo. O mar à frente ficou todo brilhante por várias horas. Quando alguma nuvem grande passava, eu via manchas negras no mar prateado. Muito bonito! E acho que ficará ainda mais, pois a lua ainda ficará mais cheia nos próximos dias. Acabei meu turno eram duas e meia da manhã e chamei o Rodrigo. Só acordei seis e meia da manhã e a Márcia falou para eu descansar mais um pouco, pois ela estava dando café para as crianças. Só acordei às oito! Esta viagem está uma grande mordomia! Tomei meu café e fiz um turno com as crianças. O vento estava ainda mais fraco e o mar mais liso. As crianças quiseram ir para a proa, sentar na cadeirinha no bico do barco. Lá, vimos muitos peixes voadores, que toda hora saiam da água. O Jonas disse que viu um grande, do tamanho de uma tainha! Ficamos um tempo curtindo a proa do barco. Neste terceiro dia, todos estão bem mais acostumados ao barco e aproveitando mais nossa travessia. No almoço, espigas de milho verde cozidas e macarrão com molho de tomate e frango defumado fizeram a alegria de todos! A sobremesa foi bolo de chocolate feito na hora que, apesar de não ter crescido por causa do chacoalhar do fogão, estava ótimo. Quando acabamos de comer eram duas e quinze da tarde e o vento não passava dos sete nós aparentes, muito pouco para um barco de 16 toneladas como o Cavalo Marinho. Ligamos o motor e continuamos avançando com as velas ainda levantadas. Dentro do barco ficou quente, mas todos ficaram do lado de fora lendo, brincando e fazendo diários, como eu agora. O mar está cada vez mais liso e a navegada tranqüila. No final da tarde, após quatro horas motorando, o vento reapareceu, ainda tímido, mas desligamos o motor para podermos dormir melhor. Durante a noite, o vento aumentou um pouco e voltamos a desenvolver boa velocidade.

 

04/12/2006

Durante a noite, o vento aumentou e o turno da madrugada foi lindíssimo, com uma lua muito cheia indicando nosso caminho. No final do meu turno, após a lua se pôr e o dia raiar, fui dormir e só acordei às dez. O dia de sol nos chamou para a proa, bem na frente do dog-house, que se tornou o cantinho para conversarmos. Os assuntos são vários: família, barcos, trabalho, planos de vida, educação das crianças, etc. O almoço foi arroz de carreteiro com frango refogado com tomates, cebola e alho, além de batata palha. Após o almoço, deitei na sala e fiquei lendo por uma hora. Tirei uma soneca para estar bem acordado no meu turno da noite. A média de singraduras é de 160 milhas por dia, o que dá cerca de 6,8 nós de velocidade média. Apesar de termos tido ventos não muito fortes, também ainda não tivemos sinal dos doldruns e sua total falta de vento.

 

05/12/2006

O turno da noite foi muito tranqüilo novamente, sem nenhum navio. De manhã, fui dormir e aproveitei até as dez novamente. Enquanto fazíamos o café, o Jonas, sempre atento, viu um grande navio vindo na mesma direção que nós, que passou a duas milhas e meia (vimos no radar, que o Rodrigo ligou para testar). O dia estava meio encoberto e havia muitas nuvens na direção de mar alto. O Rodrigo conseguiu falar muito bem no SSB e pegou as posições do Beduína e Kanaloa, os dois à nossa frente. O almoço hoje foi cachorro quente. Todos estão muito bem a bordo. As crianças ficam horas brincando com Lego e não dão trabalho algum. Nenhum deles passou mal de enjôo. A tarde foi dedicada novamente à leitura e estou gostando muito do livro “Pai Rico, Pai Pobre” e pretendo fazer uma “educação financeira” com meus filhos. No final da tarde, entrou um pirajá forte, que levou o vento para a casa dos 28 nós. Como o Cavalo Marinho é muito robusto, simplesmente arribamos para pegar o vento por alheta e abrimos um pouco as velas. A chuva, que veio com o pirajá, molhou todo o cockpit, mesmo com bimini e dog-house! Quinze minutos depois, tudo acabou. Anoiteceu e fizemos um lanchinho no cockpit. Durante o turno da noite, outros pirajás semelhantes entraram.

 

06/12/2006

Durante meu turno da madrugada, entrou outro pirajá forte, com muita chuva. Usamos a mesma tática de arribar e folgar as velas e em pouco tempo tudo acabava novamente. Quando acabei meu turno da madrugada, o vento havia enfraquecido muito. Acordei às oito, com o dia ensolarado, mas com muitas nuvens em toda nossa volta. Tomamos o café e coloquei as crianças para fazerem diários e estudarem (não sem algum esforço!). Durante a tarde, mais alguns pirajás entraram e, quando eram cinco horas, entrou um mais forte, que não nos deixou tomar nosso tradicional banho de mar no final da tarde. Este, além de forte, com rajadas de 28 a 30 nós, não parava. Recolhemos a mezena para passar a noite mais tranqüilos. Ficamos nos defendendo e aproveitando o vento para avançar na direção de Tobago, até que entrou uma rajada muito forte, com mais de 40 nós de velocidade aparente e nos fez dar um jibe involuntário e atravessar, pois veio de outra direção! Foi o maior pandemônio! Ficamos aquartelados no sentido contrário para o qual íamos, com o barco adernado (ainda bem que o Cavalo Marinho é bem pesado e não deitou demais). Escutei vários barulhos de coisas caindo dentro do barco e logo começamos a agir: soltei a genoa para ela passar para o outro lado e panejar; ainda bem que o Rodrigo havia colocado um cabo usado como “preventer”, que soltamos aos poucos para não danificar mastro e retranca. Com as velas do lado certo e o vento assobiando a 34 nós constantes, fechamos a genoa e olhei para dentro para ver se todos estavam bem. O que eu vi foi hilário! As crianças continuavam assistindo um filme do mesmo jeito que estavam antes, só que com um travesseiro em cima da cabeça por causa das coisas que caíram! Nem perder a atenção do filme, eles não perderam! O vento ficou soprando forte, constante entre 28 e 30 nós e soprou durante a noite inteira. Ficamos com o vento entre través e alheta, folgando as velas quando era necessário. Quando melhorou um pouquinho e o vento caiu para 18 nós, o Rodrigo fez o segundo rizo na mestra. A partir daí, tudo melhorou. Com a mestra no segundo rizo e a genoa parcialmente enrolada, podíamos correr facilmente com o vento que soprou, na rajada mais forte, 41 nós de vento aparente (calculo uns 45 de vento real nessa rajada). A noite foi longa. O vento e a chuva só arrefeceram perto do amanhecer e, enquanto isso, eu e o Rodrigo nos revezávamos ou ficávamos juntos no cockpit, quando o vento aumentava e a Márcia cuidava das crianças. O mar também ficou bem grosso e acho que as ondas chegavam a três metros de altura ou mais, pois as víamos chegando na altura dos painéis solares da targa do Cavalo Marinho. Fora a atravessada, tudo correu normalmente e o barco se mostrou muito marinheiro em mar grosso e vento forte. Quando amanheceu, com o vento bem mais fraco, mas com o mar ainda jogando um pouco, pude ir dormir e a Márcia e o Rodrigo assumiram o comando. Tirei a roupa de tempo e, ainda um pouco gelado e molhado, peguei uma manta para deitar.

 

07/12/2006

Após três horas de sono, acordei ainda gelado, principalmente nos pés, pois fiquei descalço a noite toda. Tomei um bom café da manhã e logo eu estava mais quente. Só havíamos comido uma caixa de Bis durante a noite e eu estava louco por algo salgado. O vento havia diminuído completamente, a chuva parou e o mar estava bem mais calmo. A Márcia fez pizzas, que estavam divinas com o apetite que estávamos. Tivemos de ligar o motor, pois o vento acabou de vez. Passamos o dia velejando com vento fraco e motorando. Conversando com o Rodrigo, chegamos à conclusão que também deveríamos ter feito o rizo na mestra quando o sol se pôs, em virtude dos pirajás que sopravam. Um pirajá entrou no meio da tarde e nos permitiu velejar bem, mas não por muito tempo. Comemos, dormimos e descansamos bastante, para nos recuperar da noite mal dormida. No final da tarde, golfinhos apareceram e ficaram brincando na proa do barco. Corremos todos para lá e, desta vez, a Carol era a primeira da fila. Os golfinhos foram embora e começou a cair uma garoa fina, que não evitou nosso banho de mar no cockpit. Mesmo estando um pouco frio, estávamos precisando dele! Anoiteceu e o Rodrigo conseguiu contato com o Torres pelo rádio. O Torres disse que pegou 40 nós de vento na parte da tarde também, mas que tudo correu bem. Fui me deitar cedo e a Márcia ficou no turno com as crianças.

 

08/12/2006

O Rodrigo me acordou às três da manhã. Nossa, como dormi bem! Não escutei o som do hélice girando (ele gira em falso quando o Cavalo Marinho veleja), portanto estávamos parados. Ligamos o motor e o Rodrigo foi descansar. Aproveitei o turno para fazer meu diário e não houve novidades. No final do meu turno, o vento entrou e voltamos a velejar. Acordei novamente eram nove horas. O vento estava bom e firme. Alguns pirajás nos pegaram no caminho, mas não muito fortes. A Márcia estava animada e fez um strogonoff para o almoço. Durante o dia vimos um navio, que passou em rumo cruzado com o nosso e bem perto. Velejamos bem o dia inteiro e o vento se manteve constante entre 15 e 23 nós. Antes de anoitecer, o Rodrigo fez o segundo rizo na mestra. Quando escureceu, cruzamos com outro barco, que não conseguimos identificar direito. Os turnos da noite foram de ventos entre 17 e 23 nós constantes e mar com ondas de 2 a 3 metros de popa, nos empurrando para nosso destino.

 

09/12/2006

O turno da noite foi tranqüilo e sem novidades, com sete nós de velocidade média. De manhã, um pássaro pousou nos painéis solares e depois mudou para o bote. Ele é branco, pequeno e parece uma pequena garça. Não imagino como ele veio parar aqui, mas não é pássaro para estar tão longe da costa. Parece estar muito cansado e nos deixa aproximar até uns dois metros, antes de se assustar. O Rodrigo descobriu que colocou o ponto de Tobago a umas 40 milhas da ilha. Dessa forma, não conseguiremos chegar lá domingo de manhã como queríamos, mas ainda assim provavelmente chegaremos amanhã na parte da tarde. Temos ainda a ajuda do fuso horário, pois estamos navegando para oeste e devemos ganhar uma ou duas horas de luz em relação à Fortaleza. As crianças puderam fazer seus diários e suas lições, mesmo com o mar agitado, pois estão bem acostumadas depois de nove dias no mar. Almoçamos carne de panela, arroz, feijão e palmito, que a Márcia fez para o almoço, com ondas de três metros e ventos com mais de 20 nós (e sem dramin desta vez!!!). A Márcia tentou dar comida para a ave e ela deixou-a por o prato de comida sob o bico dela! Pena que não comeu. Lavei os pratos com o balde na popa e, quando estava acabando, entrou um pirajá. Nossa amiga ave se soltou da churrasqueira, onde havia se empoleirado e, depois de tomar uma chicotada da escota da genoa e caiu na água, resolveu ir embora. Fui dormir cedo para pegar o turno da madrugada. Um navio passou bem próximo a nós eram dez e meia da noite. Entramos em contato por rádio com ele e não precisamos desviar.